• JEJUM INTERMITENTE – PARTE II

    19 de novembro, 2017

    Lizanka Marinheiro - Tratamento IntegradoO jejum intermitente é um estilo de alimentação baseado na ingestão de low carb e high fat (menos carboidrato e mais gordura). Esse jejum tem sido muito utilizado como promessa de emagrecimento rápido.

    Vamos tentar entender como funciona.

    Para fazer o jejum intermitente é preciso esquecer a regra de “comer a cada 3 horas”. Se o tempo de jejum for de 16h, você pode jantar por exemplo às 22h e aí só vai almoçar às 14h do dia seguinte – assim vai ficar 16h sem comer, conforme o estipulado. Entre às 14h e às 22h você está livre para comer quando sentir fome.

    Com relação a comer de 3 em 3 horas, as últimas pesquisas mostram que realmente o organismo pode não prescindir dessa prática, e que o espaçamento de horas entre as refeições, diminui a secreção de insulina e o efeito lipogênico da mesma. Isto se claro, os alimentos ingeridos tiverem baixo teor de açúcar, ou seja: baixo índice glicêmico.

     

    Primeira coisa então, escolher o que comer: alimentos com pouco açúcar branco, e também, eu diria, com pouca fritura embutida saturada, ( banha, óleos), uma vez que estes fazem mal comprovadamente ao coração!

    O corpo consome uma quantidade maior de energia proveniente dos carboidratos quando está em atividade física intensa. Já quando estamos em repouso, com baixa atividade energética (trabalhando em frente ao computador, por exemplo), o corpo consome mais energia de substratos derivados da gordura que você consome.

    Portanto, se temos uma alimentação cheia de carboidratos e não praticamos a quantidade de exercícios físicos necessárias para gastá-los, acabamos engordando muito mais.

    Ou seja

    Se você não é um atleta ou passa o dia fazendo atividades físicas, seu corpo fica a maior parte do tempo em repouso. Desta forma, o jejum intermitente com uma ingestão de pouco carboidrato e mais gorduras, e eu diria, saudáveis como as contidas nos ovos, peixes, azeites entre outras, aliado com atividades físicas ajuda a emagrecer.

     

     

    Para evitar problemas de saúde

    O jejum deve ser sob feito de forma responsável, com um profissional envolvido, para avaliar se há riscos  de uma falta de nutrientes e riscos de doenças mais sérias, como a anemia, por exemplo.

    Embora se fique muito tempo em jejum, quando se come a preocupação é consumir tudo o que nosso organismo necessita para funcionar perfeitamente.

    As calorias e nutrientes são equilibrados de acordo com a taxa metabólica basal, que é o mínimo de calorias diárias necessárias. Cada pessoa, possui a sua taxa e ela é calculada de acordo com a idade, peso, e altura. Por isso, é importante o acompanhamento profissional para garantir que o corpo seja nutrido com vitaminas e minerais suficientes.

     

     

    Quem não pode praticar esse jejum? E o tempo de jejum?

    Pessoas que realizaram cirurgia bariátrica, que possuem distúrbios alimentares (bulimía ou anorexia) e diabéticos não devem seguir o jejum,  mulheres grávidas, mães que ainda amamentam e atletas (ou pessoas que praticam muito exercício físico) requerem adaptações especiais para jejuarem e se alimentarem no modo low carb e high fat. Esta dieta não deve ser feita também por adolescentes, principalmente sem acompanhamento médico, pois nesta fase,  é quando o corpo precisa de mais nutrientes para se desenvolver.

    Diferentes de algumas outras formas de alimentação restritivas, que limitam uma quantidade de dias ou meses para seguir com a alimentação proposta, o jejum intermitente, não tem um prazo pré – definido, necessariamente. No entanto, a prática mostra que o tempo médio que se consegue fazer continuamente não tem sido superior a 15 dias seguidos. Isso  deve ser definido com o profissional que vai acompanhar o paciente, após um levantamento dos nutrientes que o mesmo vai precisar, sem levar riscos para sua saúde, além da tolerância que o mesmo irá apresentar, mas o tempo de emagrecimento e a maneira como levar o jejum pode variar de pessoa para pessoa.

     

     

    Com relação às quantidades:

    Quando for comer, não há limites para as porções consumidas, mas também será definido com o profissional, e o bom senso deve prevalecer!

    Por esse motivo, para atender às necessidade do corpo, precisamos escolher bem o que comer.

    As refeições devem conter alimentos de três grupos: reguladores (frutas, verduras), energéticos (pães, mandioca, batata doce, tapioca) e construtores (feijão, grão de bico, ovo, peixe).

    Ou seja, não se trata de pizza e batata frita para de matar a fome!

     

     

    Comer de 3 em 3 horas?

    E a velha recomendação de comer a cada 3 horas, prestando muita atenção em cada caloria ingerida?

    Essa ideia se popularizou nos anos 60 quando surgiram os primeiros estudos relacionando frequência alimentar e balanço energético. No entanto, com a observação de que as pessoas estavam ingerindo mais calorias do que gastando, estimulou-se a contagem das calorias nos produtos. Vieram programas como o Vigilantes do Peso, onde tudo era contado e pesado, para que as pessoas pudessem controlar as calorias ingeridas. O problema é que os “lanchinhos” sugeridos nos intervalos entre as refeições podem ser alimentos que nem sempre saciam nossa fome e aí acabamos comendo mais do que deveríamos! E muitas vezes caros, e muito calóricos!

    Baseado nas pesquisas mais recentes e na fisiologia do corpo, não é natural que comamos de 3h em 3h, exceto em algumas exceções, como em pacientes que realizaram cirurgia bariátrica, por exemplo.

     

    E quanto ao tempo de ficar em jejum – quanto maior , melhor?

    Não! Algumas pessoas conseguem fazer um jejum de até 36 horas, mas deixa claro que o mais indicado é não ultrapassar o período de 24h sem comer. A partir daí, o nosso metabolismo cai e esse é um dos motivos pelo qual não se deve prolongar o tempo sem comer pensando que vai emagrecer mais rápido.

     

    E durante o horário de jejum, é permitido comer?

    Durante o jejum você não pode comer nada, mas pode beber – coisas saudáveis.

    O ideal é consumir água, água de coco ou chás que não sejam estimulantes, como o de camomila, erva doce, capim cidreira, hortelã, hibisco e carqueja. Bebidas com cafeína acabam aumentando a ansiedade, podendo aumentar o apetite. Sucos com frutas, por serem ricos em frutose (que é um açúcar), acabam estimulando a produção de insulina e atrapalham o jejum.

     

    Prós e Contras

    Um artigo publicado na revista Endocrinology, aborda como foi a resposta de organismos submetidos ao jejum intermitente em comparação aos que mantiveram uma alimentação livre. O estudo foi feito como pesquisa de doutorado realizado no Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) pelo Dr. Bruno Chausse, com coordenação da professora Alicia Kowaltowski.

    “Os animais submetidos ao jejum intermitente eram mais leves que os animais que comiam à vontade, porém, essa redução do peso foi acompanhada por uma diminuição importante na massa magra (músculos). Isto sugere que, apesar de promover uma diminuição no peso total do indivíduo, esta dieta pode comprometer a manutenção da massa muscular. Então, sim, a dieta funciona para a perda de peso. Mas não necessariamente para a diminuição da massa gorda.”,conclui Chausse.

    Logo, para garantir que o emagrecimento seja da perda de massa gorda e não de massa magra (músculos), o jejum é mais adequado para quem pratica exercícios de musculação.

    No entanto vale lembrar que não é ideal praticar exercícios físicos muito intensos durante o período em que a pessoa estiver de jejum, devido ao cansaço e eventuais chances de hipoglicemia!

    Durante esse estudo, também foram observados alguns problemas de saúde entre o grupo que seguia o jejum, sendo eles:

    • Gordura visceral: foi observada uma maior concentração dessa gordura perigosa que fica localizada atrás do abdômen, em volta dos órgãos e proporcionalmente, a quantidade de gordura visceral em animais que praticavam o jejum intermitente era maior do que nos animais que comiam livremente.

     

    • Cetoacidose: quando nosso organismo “queima” gordura, dá origem a uma maior produção de corpos cetônicos, o que pode levar a coma, edema cerebral e arritmia cardíaca. Em menor grau, mau hálito e letargia.

     

    • Aumento dos neurotransmissores responsáveis pela sensação de apetite: enquanto se faz o jejum, há diminuição do apetite, mas o jejum não funciona como reeducação alimentar e, após término dessa medida de emergência para perder peso, corre-se o risco de engordar tudo de novo ou ainda mais – você vai continuar querendo comer muito.

    Por esses motivos, o Dr. Chausse não indica o jejum intermitente:

    “Do ponto de vista clínico, a forma mais eficiente de emagrecimento e manutenção posterior do novo peso é o consumo equilibrado e moderado de alimentos associado à prática regular de exercícios. Nenhum outro método tem se mostrado eficaz no estabelecimento de um novo peso corpóreo”.

    Isso significa que esse tipo de dieta funciona para emagrecer em curto prazo. Mas pode causar o “efeito sanfona”, (aquele em que você emagrece e engorda o tempo todo) quando parar de seguir.

     

     

    Novas evidências

    Recentes pesquisas do Instituto Nacional de Envelhecimento dos EUA vem comprovar que o jejum pode trazer mais benefícios para o organismo do que as dietas de restrição calórica, e que o jejum é capaz de aumentar o fator neurotrófico derivado do cérebro, o que gera uma melhora na comunicação entre os neurônios e uma maior plasticidade neuronal, a capacidade do cérebro em fazer sinapses (conexões entre neurônios).

    Mark Mattson, chefe do Laboratório de Neurociência do Instituto Nacional de Envelhecimento e professor na Universidade Johns Hopkins, foi além e revelou em uma das palestras do TEDx que, além de não prejudicar nossa saúde, passar longos períodos sem comer pode trazer grandes benefícios ao nosso cérebro!  Inclusive em sua palestra (veja o link acima) Mark Mattson diz que os resultados sobre os benefícios da alimentação de 3 em 3 horas estão nessa lista de estudos duvidosos. 

    Outros estudos anteriores já haviam  revelado que realmente comer a cada três horas não favorece nosso metabolismo e pode até favorecer o aumento do peso, e recentemete Yoshinori Ohsumi, biologista celular e Nobel de Medicina em 2016, também constatou que o jejum é um arma poderosa à favor da saúde. Neste estudo, feito por Ohsumi, foi comprovado a renovação celular e os benefícios diversos da dieta restritiva, já citados por Mattson em sua palestra ao TEDx.

    Chamando essa reação de “Autofagia”, o estudo feito pelo ganhador do Nobel de Medicina criou grande polêmica ao comprovar que ficar um tempo sem comer elimina as células ruins do organismo e posteriormente cria células novas, mais eficazes para o bom funcionamento do nosso corpo, além de ser eficaz no combate dos malefícios do envelhecimento e na cura de doenças degenerativas.

     

    Em resumo, a curto prazo, para um emagrecimento rápido, desde que seja bem orientada por um bom profissional de saúde da área, esta dieta funciona e tem suas indicações e benefícios, porém, de forma nenhuma substituí os velhos e tradicionais conceitos da nutrição clássica que pregam a correta alimentação equilibrada do prato simples e colorido em porções suficientes e horários bem definidos.

     

    Nada substitui a médio e longo prazo uma reeducação alimentar para mudança de hábitos.

     

    Lizanka Marinheiro – Phd, Md.

    Chefe do Setor de Endocrinologia do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente

    FERNANDES FIGUEIRA- FIOCRUZ