• Envelhecimento: para onde vamos?

    24 de agosto, 2018

    ENVELHECIMENTO- PARA ONDE VAMOS?

     

    Anualmente sou responsável por um curso no Instituto Fernandes Figueira sobre envelhecimento saudável. Nele, com alunos de mestrado e doutorado discutimos tópicos sobre como chegar e conseguir tal objetivo, em um país que
    envelhece cada vez mais rapidamente, e aqui trago algumas reflexões recentemente e sempre discutidas na grande mídia.

    Em pouco mais de dez anos , segundo previsões mais recentes , o país terá mais idosos do que crianças e adolescentes. Isto traz um alerta para estagnação da economia tornando mais urgente uma reforma da previdência com necessidades de mudanças de políticas públicas pelo governo e adequações pelas empresas visando oferecer serviços mais adequados a este público.

    No Brasil, segundo o demógrafo José Eustáquio Alves do IBGE, em 531 dos 5.570 municípios brasileiros, o número de pessoas com mais de 60 anos supera o de menores de 15 anos, sendo a maioria na região Sul e Sudeste. Niterói, no Rio de Janeiro, Santos e São Caetano do Sul em São Paulo são exemplos do que permitem antecipar a realidade nacional, abrigando juntas 224 mil idosos mais que 178.5 mil adolescentes.

    Em 2018, segundo o IBGE, será o primeiro ano em que a mão de obra crescerá em um menor ritmo que o do total da população do Brasil. É o que os especialistas chamam de fim do bônus demográfico e o que limita as chances de o Brasil se tornar um país rico, como fizeram os países ricos antes de envelhecer a exemplo do Japão. Isso porque haverá menos gente para produzir bens e serviços que constituem o Produto interno Bruto PIB.
    Nas contas do IPEA, quando a porção produtiva de pessoas em idade produtiva começar a cair, o Brasil poderá a crescer em média apenas 0,8 ao ano.

    Outra consequência do envelhecimento acelerado da população é a redução do número de pessoas contribuindo para previdência, com mais gente na outra ponta recebendo.
    Sem uma reforma para aposentadorias precoces, em 2060 o percentual de brasileiros recebendo benefícios vai dobrar passando de 15,2% em 2017 para 32%, segundo o IPEA.

    Dados da ENCE, (Escola Nacional De Ciências Estatísticas), apesar de o bônus etário ter começado a se fechar, a estrutura etária da população ainda continuará favorável ate 2030. Último ano que teremos mais crianças de 0 a 14 anos que idosos. Porém as taxas de subemprego e desemprego e má qualidade de educação não garantem o aproveitamento deste bônus.

     

    SOLUÇÕES ISOLADAS JÁ ENCONTRADAS

    “O caminho para sobrevivência é estar antenado a se preparar para uma nova carreira. Aposentados que retornam ao mercado de trabalho são mais felizes”
    diz Lucia França especialista em psicologia e consultora de carreiras.
    O segredo é se reinventar como já fazem alguns idosos que buscam outras atividades laborais após aposentadoria.

    Estudar o mercado, fazer cursos, e frequentar cursos de inovação e capacitação é o caminho para o idoso se preparar para uma nova carreira e se preparar para voltar ao mercado de trabalho depois dos 60.

    A chamada quarta revolução industrial valorizará a habilidade que o computador não tem e que sobram nos maduros como inteligência emocional, e flexibilidade cognitiva. A falta de reflexão sobre a aposentadoria atrapalha a permanência de muitos profissionais na ativa no mercado de trabalho. Existem os PPAs (Programas de Preparação Para Aposentadoria) no estatuto do idoso desde 1980, que instrue idosos sobre saúde, gestão financeira, lazer e transição de careira , mais poucas empresas o colocam em prática.

    Os aposentados que voltam ao mercado de trabalho são mais felizes, trabalhando por dinheiro, e prazer por se sentirem ativos. Faltam políticas publicas que estimulem a contratação de profissionais mais velhos para cargos como conselheiros em empresas, consultores , mentores, professores , profissionais de planejamento estratégico e mesmo gestores em start-ups. O conhecimento e expertise dessa idade é o diferencial!

    Em certas funções o idoso não é o de bengala e sim a aquele que tem paciência , não tem pressa e gosta de conversar com o cliente. O funcionário idoso é cobrado pela qualidade do atendimento e não pela produtividade.

     

    Soluções atuais já testadas

    Cidades como Niterói, São Caetano do Sul e Santos no já tem os maiores índices de idosos do Brasil, e antecipam a solução de problema para 2031, detendo o mais alto IDMHM (índices de desenvolvimento humano ) do país, indicador que considera longevidade, educação e renda. As 3 cidades também apontam para o sucesso de políticas públicas de longo prazo, independente de mudanças administrativas

    Em São Caetano a cidade fica com 27% do orçamento da secretaria de saúde para ser gastos com idosos.
    Lá existem os Centros Integrados de Saúde e Educação, consumindo R$ 20 MILHÕES por ano com aulas de dança, esportes , informática e idiomas. Ate 2019 a cidade quer abrir mais 2.
    Em Santos, com 3 vezes mais idosos que São Caetano, os maiores de 60 anos correspondem a 20% da população correspondendo a 28% dos atendimentos, fazendo com que a prefeitura aumentasse de R$ 149 milhões em 2017 pra R$166 em 2018, recursos estes voltados para programas de saúde da terceira idade.

    Niterói só criou há 3 anos a secretaria do Idoso e vai gastar R$ 1,6 milhão para implementar um centro de convivência para atividades físicas e cursos. Tem há 40 anos um dos programas de educação física para idosos, o programa GUGU, que funciona de segunda a sexta em 40 núcleos. Agora o idoso demanda muito mais que apenas aulas de dança e musculação.

    Nas três cidades o idoso quer uma ocupação como trabalhar, ter relacionamentos e se integrar a sociedade.

    Em Santos a secretaria De Desenvolvimento Social está investindo R$ 3,6 milhões no programa você sabe tudo que transforma idosos, como guias no antigo sistema de bondes da cidade. O “Você sabe tudo”.

    Em Niterói existem rodas de conversa entre vizinhos, toda semana para oficinas e atividade de lazer em polos de centros de convivência para terceira idade. A Casa Convívio dos Anawim, que atua há 18 anos na cidade, promove atividade mais perto dos idosos com ajuda de voluntários no bairro de Santa Rosa, está com sua capacidade esgotada tamanha a demanda. Para aderir ao programa o síndico basta entrar em contato com a casa.

    O Agente sênior  em São Caetano do Sul,  são recrutados 200 idosos por ano, ( passando por triagem média e entrevista acirrada), para trabalharem na administração pública que ganhem até 2 salários mínimos, para receber cesta básica e R$954 Reais, trabalhando 4 horas por dia.

    Já em Santos  existe o Programa Vô de taxi –, um Programa que  capacita motoristas de taxi a levarem idosos que passam de 90 mil pessoas, ao médico, hospitais , etc, melhorando a mobilidade dos mesmos. Mais de 10 taxistas já receberam a capacitação que inclui aulas teóricas sobre o envelhecimento, e uma parte prática com fisioterapeutas sobre cuidados om embarque e desembarque das pessoas maiores de 60 anos. Os professores simulam o uso de cadeiras de rodas e bengalas, e treinam os motoristas em como melhor atender esses idosos. A ideia uniu a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), cooperativas e Sindicato de Taxistas. No fim do curso, ele recebe um diploma de taxista amigo do idoso.

    É preciso ter paciência e boa vontade, e unir esforços da iniciativa pública e privada para nos prepararmos para a velhice saudável e produtiva, pois um dia todos chegaremos lá.

     

    Lizanka Marinheiro -Endocrinologista
    Profa. Pós-Graduação de Saúde da Mulher e da Pós- Graduação em Pesquisa Clínica Aplicada
    Instituto Nacional de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente – Fernandes Figueira FIOCRUZ

    Fonte – Jornal o GLOBO (05-08-2018)